O carteiro é aquele moço que sabe exatamente onde fica cada rua, cada casa. Sabe o nome dos moradores, bebe água daqui, dali, conversa com as senhoras, come bolinho de chuva com banana, vive com um sorriso largo cumprimentando todo mundo!
Nunca vi um carteiro maldizendo a vida, rogando praga no dono do casebre da parte mais alta da rua ou reclamando do cachorro que correu atrás dele semana passada. Sempre recebe tudo com um belo sorriso.
Acontece que ultimamente o carteiro anda cabisbaixo. Nada de sorriso largo, nada de cumprimentar a vizinhança. Hoje ele sai da central mudo, entrega o que deve entregar e volta calado, com sede, cansado. Às vezes usa até fones de ouvido enquanto trabalha para passar o tempo.
É que nos últimos tempos, o senhor que vivia parado de plantão ao lado da caixinha de correio esperando receber notícias da filha, fica dentro de casa no computador, vendo vídeos engraçados no Youtube. A mocinha que sempre entregava cartas perfumadas e cheias de coraçõezinhos e esperava ansiosa pela resposta, tem ficado mais tempo trancada no quarto com o Skype aberto, sequer sai na rua, sequer vê o carteiro passar. O dono da alfaiataria que enviava e esperava a resposta dos orçamentos, aquele que sabia a hora que o carteiro passava e sempre tinha um café fresco e água gelada para oferecer, este hoje usa o Mercado Livre e nem sabe mais o tamanho do sorriso do carteiro novo.
Todos passam correndo, não sabem seu nome, onde mora ou se seu sonho sempre foi ser carteiro ou não. O invisível carteiro hoje é amaldiçoado: Ih, lá vem o carteiro entregar mais contas para pagar. Ouvi certa vez uma criança perguntando: Mamãe, para que serve essa caixinha que fica no portão da casa daquela moça? Ah minha filha, é ali que o carteiro coloca as dívidas que ela precisa pagar ou propagandas de ofertas em supermercados.Os cachorros só levantam a orelha vendo o homem passar, não se dão o trabalho de latir e avisar sobre a correspondência que chegou.
E vai o carteiro pelas avenidas, olhando o chão, ouvindo música, sem conhecer ninguém, sem ser esperado ou anunciado. Se antes o carteiro era o que trazia notícias de longe, sentimentos guardados em pequenos envelopes, hoje é um cara vestido de amarelo e azul que anda pela rua jogando as cobranças para dentro das casas. Diariamente é esquecido ou maldito. Se fica cansado não há água fresca, se quer dar um tempo, toma sozinho um cafezinho na padaria, que era do Manuel, mas hoje é a Panificadora São Vicente, onde a atendente faz tudo com computador e sequer recebe o bom dia. Hoje trabalha sem saber para quem, sem saber os motivos de ninguém. Pode até ter amigos europeus no Facebook, mas nunca terá o prazer de acompanhar a feição de alegria com a notícia de uma gravidez muito esperada que acaba de acontecer. Não vai mais provar os bolinhos de chuva da Dona Maria ou o Macarrão à bolonhesa do Senhor Jaime.
Não vai mais ser perguntado pelas cartas de Jacinto, que foi para a guerra e parou de escrever há meses. Às vezes se perde na rua, porque na esquina em que antes era a casa da saudosa família Henriques, virou uma porção de apartamentos de dois quartos. O Bar do Magrelo, que todo mundo ia tomar uma gelada depois do expediente, compraram o quarteirão e fizeram um Carrefour vistoso.
Então ele faz seu serviço, reclama do calor, liga seu Iphone, e manda um WhatsApp com palavras de saudade para a esposa que trabalha no outro lado da cidade. E ambos chegam em casa tão cansados que só conseguem comer e cair na cama.
Que horas passa o carteiro na sua rua? Como ele se chama?
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