
Um belo dia, ela acordou e nem sequer reconheceu-se no espelho. Rugas na testa, olhos caídos, aquele inchaço no rosto e as olheiras fundas e escuras.
Engoliu alguns comprimidos.
Lembrou-se dos tempos alvos, do frescor dos anos que passaram em uma só noite. Sentiu saudade. Arrastou-se de volta para a cama.
Ao lembrar, uma lágrima invadiu seu rosto. Fechou os olhos e vizualizou imagens. Beijos, canções, esportes, notas, namoradinhos, amigos que se perderam no ar...
Só havia restado as lembranças, daquelas que nos fazem sentir tudo como se estivesse acontecendo. Daquelas que nos podem arrancar um sorriso, um telefonema ou um amor escondido por baixo das costelas.
Ela havia se esquecido o quão importante era se deixar chorar. O mundo a havia feito abrir muito os olhos. As lágrimas haviam descido por dentro, para o coração, que virou pedra e já não batia mais tanto quanto antes.
Ah! Os anos dourados que aqueles lábios haviam vivido... Todas as palavras, os olhares, as vozes, as canções... Tudo resumido a uma lágrima na cama com os olhos fechados. Uma adolescência, uma vida!
Lembrava-se de estar na janela olhando os pássaros, até conversava com eles, pedia que cantassem mais alto. Certa vez começou a ter insônia e maldisse os pássaros que a não deixavam dormir em paz pela manhã. Desde então viu-se "na varanda fria, ao relento..."
E a menina do sorriso bonito, dos olhos grandes e brilhantes, da empolgação constante e interminável alegria, tornou-se essa velha enrugada e rabujenta.
Seu pensar virou tristeza, seu senso crítico virou chacota, suas certezas momentâneas e fugazes, muitas vezes infantis e engraçadas, viraram mazelas comerciais. Até mesmo seu espírito aventureiro virou o medo por detrás das grades da cidade.
E aquelas rosas que um dia recebera já haviam murchado há muitos anos, aqueles poemas e canções a ela dedicados já eram ditos demodé.
Teve uma saudade mais forte, apertou o travesseiro contra os peitos caídos, outras lágrimas lhe invadiram o rosto. Debulhou-se. Quis adorar os pássaros, quis sorrir para o Sol e dançar no meio da rua. E RIU O MAIS ALTO QUE PODE com os soluços de choro.
Mas já não tinha a mesma coragem... Adormeceu.
Eram somente lembranças, nada mais...
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