Edgard era um bom homem.
Trabalhava de Sol a Sol, não descansava muito. O tempo livre que tinha, namorava. Era namorador, isso era.
Gostava de chuva e bolinho de chuva quando chovia. Comia bem, dormia pouco, mas era saudável.
Ouvia música durante pouco tempo por dia, preferia o silêncio ou o barulho dos carros passando na rua, atritando com o asfalto.
Quando viajava gostava de ficar sozinho, mesmo que fosse acompanhado.
Costumava correr algumas vezes por semana na praia.
Um dia encontrou um amor: Carolina, linda com seus olhos grandes e curiosos, cabelos na cintura, lisos lisos.
Começou a trabalhar menos para ficar mais tempo com ela. Comia bolinho de chuva mesmo sem chuva; quando ouvia a chuva cair, caía no sono.
Encantou-se por músicas românticas, passou a não tirá-las do som do carro, da sala, do quarto.
Começou a assistir mais televisão: filme, pipoca, sofá, cobertor, beijos.
Tomou gosto por cinema e McDonald's. Começou a tomar vinho barato e cerveja.
Deu mais valor ao boteco depois do futebol do que ao jogo em si.
Casou-se, teve dois filhos bonitos, com quem passava algum tempo.
Voltou a trabalhar avidamente para conquistar coisas para os filhos.
Carolina já não tinha os olhos tão vivos e seu cabelo já não era tão liso ou comprido. Pareciam ambos cansados. Estavam cansados demais para sofá, cobertor, beijos e filmes. Ficavam despertos somente até a parte da pipoca.
Parou de comer bolinhos de chuva.
Carolina chegava tarde, ia para a ginástica, para o Yoga, para o Pilates, reunião do condomínio aos domingos.
Um belo dia, após o aniversário de 14 anos da filha mais nova, Edgard amanheceu morto.
E nunca mais pode ouvir o barulho dos carros no asfalto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário