terça-feira, 30 de junho de 2020

Diário de quarentena #8

Antes da dor que explode, transborda e grita, existe a dor sussurrada, em conta-gotas, implodida. Não pense que quem grita sofre mais do que quem cala. Imagine um afogamento em que a água ocupa o lugar do ar que sairia como um grito de socorro que atravessaria o oceano se pudesse.
Gargalhadas escondem as lágrimas que ficam entaladas, às vezes não têm força para sair, mas também já não cabem num peito tão inundado pelo tempo. Ficam ali travadas, engrossando os nós na garganta, alimentando as paranóias.
Não sei se falo de mim, de outro, de nada. Pode mesmo ser um drama danado, mas dói. E eu posso não saber falar de outro jeito. Comunicar não é coisa fácil. Quanto mais falo, menos digo. Ainda existem os entraves e barreiras nos ouvidos de quem na verdade não quer escutar o que não agrada.
Me expresso de outro jeito, porque as gargalhadas escondem muito bem as lágrimas. Lágrimas que decepcionam a necessidade compulsiva de ter felicidade.
Não ter felicidade é sinal de fraqueza, incapacidade, falha. Eu não acredito nisso ou tento constantemente não acreditar para poder me confortar.
Não vou ficar, a essa altura, questionando o que é felicidade. Não me importa.
Olhares, palavras, gestos, energias. Braços cruzados, sorrisos engolidos, sarcasmo. Essa não sou eu, embora às vezes me venha ser essa. Esse é o mundo algumas vezes. Entende que dói? Poderia ter um nome. Parece que se tivesse um nome eu conseguiria colocar em uma caixa e guardar no fundo da gaveta, esquecer.
Diferente disso: ensimesmamento. Isso existe.
Se aparentemente estou para fora e expansivamente ocupando o mundo, na realidade estou fechando todas as brechas e abrindo apenas aquilo que posso e quero que seja acessado. Da mesma forma, se estar para dentro está aceitável, então o fora se torna fluido e tranquilo, seguro.
O mundo é hostil. Não sou um cristal, queria ser para poder quebrar, mas não sou.
Cascalho. Se um cascalho quebra não tem importância porque continua dando boa massa e não há por que se importar. Que bom que sou um cascalho, mas que pena que vou quebrar muito ainda.

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